1. Em sua opinião, são os principais desafios enfrentados
pela gestão dos recursos hídricos no Brasil atualmente?
Na necessidade da gestão dos recursos hídricos através do
modelo implantado no Brasil desde 1997 identificamos uma
fricção entre os preceitos que se colocam a partir da água
como bem espio ritual, social, cultural e econômico e sua
dimensão na política e na economia. A água vem colocar em
cheque pressupostos da prática política tradicional frente
um contexto em que a água é percebida pelo sistema
capitalista , cada vez mais como insumo econômico, mas ela
coloca-se como bem ambiental com importância muito além
dos bens tangíveis e intangíveis que a perspectiva
economicista sugere.
Nesse sentido estamos vendo que o Estado enquanto ente
institucional que regula as relações políticas e econômicas
entre cidadãos e suas instituições, não conseguiu captar o
imenso potencial aglutinador e convergente da água como bem
comum e bem ambiental superior disponível para humanidade. O
estado brasileiro com suas mazelas congênitas históricas,
tais como o patrimonial ismo ,corporativismo e um
capitalismo historicamente peculiar e anacrônico, vem se
mostrando insuficiente para IMPLEMNETAÇÃO de práticas
convergentes , aglutinadoras e revolucionárias que a água
possibilita.
Nesse sentido a implantação de uma política pública para
gerir um bem público como é a água vem se deparando com
paredes que se mostram quase intransponíveis e que reduzem a
gestão da água a uma dicotomia pautada numa visão ideológica
da água como bem econômico verso bem social e alimento e
direito humano fundamental a todos. A água, por si, se
obriga como direito de todos indistintamente, contrapondo-se
a uma lógica capitalista que a reduz a um bem acessível
desigualmente. A água na sua essência não possibilita
construção ideológica mercantilista.
Assim, enfrentamos no dia a dia, desafios permanentes para
implantação dos instrumentos para sua integração e sua
gestão eficaz no âmbito das políticas públicas instituídas
para sua disponibilidade equânime com sustentabilidade
ecológica.
2. Quais são os limites da gestão participativa e
descentralizada? O senhor enxerga algum tipo de efeito
colateral nesse tipo de gestão?
A gestão participativa é um princípio incorporado nos
normativos e regulamentos jurisdicionais da política
nacional e estadual para gestão dos recursos hídricos, mas
enfrenta pesada resistência dos demais interesses econômicos
e políticos que se afirmam a partir da importância econômica
da água. No Brasil tem lei que pega e lei que não pega. Há
Interesses sobre água que tornando-se HEJEMONICOS NO ESTADO
operam DE MANEIRA EXPLICITA UM PROCESSO PERMANENTE DE
ESVAZIAMENTO E DESQUALIFICAÇÃO da gestão participativa
enquanto conceito, prática e quando da afirmação dos
movimentos sociais e representações da sociedade nos
colegiados estabelecidos para sua gestão tais como comitês
de bacias e conselhos. No âmbito do aparelho do estado a
operação dos instrumentos da gestão é que permitem o maior
força das reivindicações sociais através de seus
representantes nesses colegiados e esta é a todo momento,
solapada e enfrentada pelo poderio econômico.
O efeito colateral de uma política publica para gerir e
tomar decisões sobre um bem público como a água acontecerá
quando a população sentir e sinalizar claramente que ver
seus rios sendo gradualmente saneados, a melhoora de
indicadores ecológicos de sua condição nas suas respectivas
bacias, a melhoria dos indicadores de salubridade
ambiental dos rios e corpos d'água em geral e o interesse
publico no que diz respeito ao uso múltiplo das águas serem
efetivamente garantidos sem colocar em riso a
sustentabilidade ambiental e o desenvolvimento equilibrado.
Infelizmente, isso não é visto de maneira contundente. Muita
gente boa, que enxergara no sistema de gestão das águas
explicitado na lei 9433 já desistiu da luta. Impõe-se por
parte de corporações, um falso dilema de que, "é preciso
construir um sistema antes de se resolver os problemas que
surgem a cada dia e são denunciados pelas representações das
organizações civis nos colegiados." Esvazia-se a idéia de
política pública, através da apologia a uma idéia de
"sistema" que obscurece o conceito dessa política. O sistema
tal como se apresenta, é burocrático, tecnocrático e
autoritário sugerindo que o princípio da participação social
é uma idéia simplista, tecnocrática e fundamentalmente uma
Idea limitada do valor social da água e das relações sociais
que ela expressa. Em síntese tal cenário se expressa através
dos seguintes pontos:
 Limitações dos agentes públicos para construção
de novos paradigmas na relação estado x soc. civil.
 Subalternização da política publica a interesses
econômicos e patrimonialistas
 Hegemonia do setor elétrico na definição de
estratégias.
 Cooptação que favorece a corrupção
 Idealização por parte dos agentes públicos, da
sociedade a partir de uma visão romântica da participação.
 Impotência política do Estado na aplicação e
fiscalização no cumprimento da lei para garantia dos
direitos sobre o bem publico Água.
 O estado despreparado para a gestão colegiada
 A subalternização da visão social pela visão
tecnocrática de gestão. ( fruto da hegemonia histórica da
tecnocracia e burocracia)
 A falsa idéia de que a legitimidade dos atores
políticos da soc. civil se dá a partir do Estado que
instituiu o sistema e seus agentes, e não na relação
dialógica com e entre os atores sociais que se auto
instituem a partir de suas reivindicações e posições.
 Manipulação das estratégias dos colegiados por
causa do menor nível de desconhecimento dos atores locais.
 Falta de paridade nos colegiados que impede a
dinâmica política da "negociação" e conseqüentemente acordos
legítimos e compromisso s na participação
3. Quais são os principais conflitos existentes nas
organizações de bacia na atualidade?
Vale dizer, porém, que uma reelaboração das políticas
publicas estadual e nacional de recursos hídricos por parte
da sociedade civil, seus movimentos e expressões
institucionais nos espaços colegiados de gestão tais como
comitês e conselhos como processo continuo que se aperfeiçoe
é extremamente necessária, mas um grande desafio. Os limites
políticos das organizações civis frente a esse contexto são
evidentes e sugere que setores esclarecidos da sociedade e
os movimentos sociais superem práticas ortodoxas de falsos
maniqueísmos, falsos dilemas e sectarismos, para construir
convergências operacionais na gestão das águas nos
colegiados e no debate político na sociedade. Disseminando
informações e articulando os espaços legais de atuação
espelhando-se na malha de rios de uma bacia hidrográfica que
tanto expressa a necessidade de integração entre o saber
social e tecnológico, a superação da visão tecnicista peo
saber social.
Nos comitês e conselhos, os atores entusiastas da visão
tecnocrática e burocrática querem reduzir as possibilidades
da política publica para as águas a uma mera gestão de sua
qualidade e quantidade sem considerar que as variáveis
ambientais ecológicas e sociais que invariavelmente se impõe
quando se trabalha e gerencia um bem publico tão específico
como as águas, bem como os rios e suas transversalidades com
as mais diversas dimensões da vida das pessoas.
O Patrimonial ismo macula uma pretensa idéia de estado
democrático e de direito para o qual lutamos historicamente,
e quer nos impor na gestão das águas, uma visão instituída
de sociedade. Não é sensivel a uma sociedade que se institui
a cada dia e coloca novos paradigmas para se viver dentro
das politcas para as águas. Tudo isso constrói um contexto
onde a visão economicista de desenvolvimento a qualquer
custo obscurece o fato de que, a acumulação de riqueza por
uns em detrimento da maioria, agora se coloca a partir da
explotação da água como bem ambiental e insumo fundamental
que tem que ser apropriado sem se incomodar com a
desigualdade social, sem considerar seu valor ecológico como
bem publico, ou seja, a natureza como detonadora da
acumulação em cima da reprodução da desigualdade social,
apropriação do patrimônio hídrico e ecológico das futuras
gerações. Que o diga a selvageria que estamos vivendo na
conduta da política de recursos hídricos no estado de Minas
Gerais, que visivelmente mostra a subalternação dos
preceitos e fundamentos legais da gestão da águas , a
projetos mesquinhos, menores descomprometidos com a
cidadania e respeito ao patrimônio ambiental das futuras
gerações.
4. O que ainda precisa ser feito, em sua opinião, para
promover a gestão dos recursos hídricos no Brasil?
A sociedade brasileira muito aos poucos supera uma visão de
que á água, bem como os demais patrimônios ambientais são
infinitos e vai ainda que
lentamente, instituindo uma relação dialética com a
institucional idade montada para a gestão das águas. Se não
podemos endossar uma visão de "sistema de gestão" idealizado
para ser eficaz apenas para o setor econômico e a
burocracia ,temos que admitir as imensas
possibilidades da água como elemento de grande potencial de
mobilização e construção de conquistas de direitos sócio
Ambientais nas políticas públicas.
Mas muito ainda é preciso ser feito. É importante não
alimentarmos a idéia de que uma crítica unilateral a
insuficiência do estado em operar os fundamentos das
políticas públicas tais como descentralização e
co-participação, por si, explica as causas da ineficácia da
gestão dos recursos hídricos.
 A promoção de uma gestão eficaz das águas que
cumpra suficientemente os postulados e fundamentos que a
definem em lei, vai se dar muito mais por uma postura
afirmativa da sociedade nas instâncias de gestão e a
integração e a absorção das demandas sócio ambientais pelos
demais movimentos e articulação dentre as organizações da
sociedade civil. Vai se dar pela superação dos limites que
impedem os setores organizados da sociedade enxergarem novos
paradigmas de organização que a questão ecológica impõe as
práticas políticas dos movimentos sociais e suas
representações civis frente as políticas públicas . O
sectarismo, e as limitações patológicas da ação política
militante de muitos atores envolvidos e preocupados com a
gestão das águas, haverão de ser enfrentados para construção
de uma nova postura das organizações civis nos colegiados de
gestão, de maneira afirmativa, propondo agendas a partir da
própria necessidade e visão das comunidades e suas
lideranças nos comitês de bacias e não, serem
desqualificados e figurantes de uma agenda política de
outros seguimentos dentro desses colegiados. A tarefa que se
impõe, portanto, é de organização permanente da sociedade
para o cumprimento de sua missão nos colegiados e fora dele,
de maneira mais qualificada e militante. Elevando a questão
da água enfrentando o debate e construindo através da
política ..a gestão integrada e competente. Dar-se-á de fato
quando o seguimento das org. civis tiver condições políticas
e técnicas para fazer valer uma agenda nos CBHs e Conselhos,
identificada com as suas realidades e necessidades dos
grupos coletivos que o elegeram, e compatíveis com a
possibilidade de serem contempladas pela política pública
das águas" assim eles construirão uma "legitimidade" a
partir dos grupos sociais que os elegeram e não, através da
cooptação. Essas condições são impedidas por fatores e
estruturais e políticas acima assinalados.
João Clímaco Filho
Professor Bacharel em Ciências Sociais e membro da
coordenação do FONASC-CBH
FÓRUM NACIONAL DA SOCIEWDFADE CIVIL NAS BACIAS
HIDROGRÁFICAS.
Conselheiro Representante das Org. Civis e Movimento Sociais
no CNRH.
****************************************
O grande portal dos mineiros
http://www.uai.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário